Entrei na Sex Shop

Entrei na Sex Shop

Onde está a criatividade e a sensualidade das pessoas deste país tão tropical?

 

  Levei quarenta e quatro anos para tomar coragem de entrar em uma sex shop. Gosto da idéia de focar os pensamentos no prazer. Por esta razão sempre achei interessante uma boutique especializada nisso. Até aí nenhuma novidade. Os bordéis antigos tinham mais ou menos essa intenção.

Mas uma loja, assim misturada às outras, na mesma rua, dividindo calçada e freguesia, sempre pareceu-me um atrevimento muito mais simpático, uma ousadia malandra que merecia ser averiguada com maior carinho.

  As primeiras de que me recordo eram equisitíssimas: lúgubres, sempre com fachadas pretas e cinzas e um ar de pecado não realizado. Tinham um aspecto decadente, velho, nada atraente. Faltava-me vontade para entrar em uma delas.

  Depois de algum tempo elas evoluíram: tornaram-se coloridas com vitrines festivas, declaradamente comerciais para chamar a freguesia. Lembro-me de uma vez ter passado por uma em Nova Iorque com anúncios de saldos, etc. Quase entrei, mas não vi nada ali que me inspirasse.

  Anos depois as sex-shops tornaram-se politicamente corretas; começaram a vender não apenas artigos eróticos, mas também toda uma linha no mesmo tema como lingeries, sabonetes, sachês, etc, além dos brinquedinhos mais picantes. Com jeito de grande magazine e vendedoras que parecem dar mais importância às parcelas ou tipo de cartão com que se paga do que aos produtos em si. Não um local para estimular novas e intensas experiências sexuais.

  Minha alma romântica ainda ansiava por uma lojinha pequena, privada o suficiente e de acesso fácil. Um dia encontrei-me em frente a uma exatamente assim: passava por um Shopping Center e eis que, escondida no final de um corredor, avistei a vitrine caprichadíssima e sugestiva de uma pequena sex shop. Acreditam que até me emocionei enquanto caminhava em direção à porta? Respiração alterada, entrei. E demorou um pouco para perceber que havia algo incongruente com o que estava preparada para encontrar.

  Um choro de bebê! Vinha de trás do balcão onde a mãe, sentada ao caixa, preparava placidamente o peito para oferecer ao filho. Enquanto ele mamava, a avó do infante se aproximou e começou uma conversa de mamadeiras e arrotos com a filha que, naturalmente, desencorajava qualquer pensamento que não estivesse relacionado a fraldas.

  Saí tristíssima, convencida de que, definitivamente, a sex shop que eu idealizara só existia na imaginação. Não que tenha visitado tantas, mas o que vi até agora é sofrível. Onde está a sensualidade das pessoas desse país tão tropical? Ou a criatividade, ou a imaginação?

  Desanimador mesmo. Mas nada que se compare ao letreiro que vi outro dia: Sexo delivery – conveniência erótica. Claro que se esgotaram as idéias. E pode até ser bom,quem sabe agora inventam outra.

 

Por Cláudia Matarazzo

Fonte: Revista Classe – Edição Bimestral – 26 de dezembro de 2003/29 de fevereiro de 2004

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